Para escolher o melhor candidato, tente não escutar a voz
Parece que foi ontem… Eu estava lá ouvindo as palavras de um ex-sindicalista, e segurava com mãos jovens de esperança uma bandeira vermelha. Quando eu chegava a minha velha casa, discursava aos parentes, ainda eufórico, revelando grandes expectativas para o nosso futuro. O poder voltaria para as mãos do povo (voltaria?), uma onda de liberdade verdadeira invadiria o país, a redistribuição de renda seria justa e igualitária, o pobre enfim teria voz! E deitado na cama eu me esbaldava sobre as teorias de Marx, a ideologia de Gramsci, as ideias de um estado maravilhoso que prometia igualdade entre as pessoas. Na parede do quarto um imenso pôster de Lênin me abençoava, e a pressa da juventude me fazia ver ali um mito, um herói sem capa ou fantasia. Parece mesmo que foi ontem.
A razão estava ao lado dos que sempre pareciam ter razão, e eu os ouvia, idolatrava! A voz que bradava ordem levava consigo o tom da revolução, necessária para mudar e quebrar com o sistema podre, corroído. O capitalismo, esse vilão maldito, era o verdadeiro devorador de criancinhas. As elites, essas prostitutas capitais, deveriam ser extirpadas da face da terra. O ódio era o nutriente infalível do amor à causa. A morte, em certos casos, seria o sinônimo da vida nova. Eu era jovem e gostava de uma boa briga. Eu era jovem e ainda brigava sem saber.
Sob o sol da primavera eu vi as bandeiras tremulando, as faixas no alto dos prédios, os carros passando em festa, as buzinas eufóricas alertando nosso feito. Vencemos! Sim, sem precisar pegar em armas, nós vencemos! Tudo seria diferente agora, o povo chegava ao poder, o povo era a nova liderança do Estado!
Hoje não escuto a voz, eu leio as entrelinhas. Talvez tenha amadurecido, talvez tenha perdido o sonho, ou no amadurecimento da visão eu tenha começado a sonhar. Um brinde à democracia.